Antônio Carlos Jobim
Matita Perê
No jardim das rosas
De sonho e medo
Pelos canteiros de espinhos e flores
Lá, quero ver você
Olerê, Olará, você me pegar

Madrugada fria de estranho sonho
Acordou João, cachorro latia
João abriu a porta
O sonho existia

Que João fugisse
Que João partisse
Que João sumisse do mundo
De nem Deus achar, Ierê

Manhã noiteira de força viagem
Leva em dianteira um dia de vantagem
Folha de palmeira apaga a passagem
O chão, na palma da mão, o chão, o chão

E manhã redonda de pedras altas
Cruzou fronteira de servidão
Olerê, quero ver
Olerê
E por maus caminhos de toda sorte
Buscando a vida, encontrando a morte
Pela meia rosa do quadrante Norte
João, João

Um tal de Chico chamado Antônio
Num cavalo baio que era um burro velho
Que na barra fria já cruzado o rio
Lá vinha Matias cujo o nome é Pedro
Aliás Horácio, vulgo Simão
Lá um chamado Tião
Chamado João

Recebendo aviso entortou caminho
De Nor-Nordeste pra Norte-Norte
Na meia vida de adiadas mortes
Um estranho chamado João

No clarão das águas
No deserto negro
A perder mais nada
Corajoso medo
Lá quero ver você

Por sete caminhos de setenta sortes
Setecentas vidas e sete mil mortes
Esse um, João, João
E deu dia claro
E deu noite escura
E deu meia-noite no coração
Olerê, quero ver
Olerê
Passa sete serras
Passa cana brava
No brejo das almas
Tudo terminava
No caminho velho onde a lama trava
Lá no todo-fim-é-bom
Se acabou João

No Jardim das rosas
De sonho e medo
No clarão das águas
No deserto negro
Lá, quero ver você
Lerê, lará
Você me pegar